Henrique Acker
O fenômeno Bolsonaro é resultado de inúmeros fatores. Sempre existiu no Brasil, como em outros países, uma parcela importante da população que tem hábitos e costumes conservadores. Esse segmento ficou órfão quando o governo Temer e seus aliados (PSDB, DEM, etc) caíram em desgraça. A expectativa da saída de Dilma e a posse de um novo governo se frustrou rapidamente, com propostas impopulares e métodos tradicionais, como a corrupção e a troca de favores.
A construção da candidatura da extrema direita obedeceu a alguns critérios básicos: 1) Atrair esse setor da sociedade, aproveitando-se da desmoralização do governo Temer; 2) Montar um esquema de comunicação direta profissional, nas redes sociais, visando atingir e sensibilizar os mais conservadores com peças publicitárias bem montadas, sobretudo na área do moral e dos costumes. Isso virou febre no Facebook e, principalmente, no Whatsap, via grupos familiares.
Esse foi o setor do eleitorado que deu a base inicial, quando Bolsonaro alcançou 20%. Na reta final da campanha prevaleceu a polarização que interessava à extrema direita: enfrentar o PT. Por que? Porque as candidaturas de centro-direita e centro, que interessavam disputar, não conseguiriam ter forças para resistir e responder à polarização. Seu eleitorado sucumbiu ao apelo da extrema direita e migrou para Bolsonaro, pelo apelo anti-petista e a rejeição ao PT.
Para isso também foi importante a decisão dos dirigentes de diversas seitas neopentecostais, antes ligadas à campanha de Alckmin, que se bandearam junto com os partidos do Centrão para a candidatura Bolsonaro. Os cultos que precederam ao dia da eleição foram verdadeiros festivais de apelos dos pastores, uma gigantesca boca de urna, que misturou mentiras, preconceitos e fé.
No entanto, mesmo conquistando 46% dos votos válidos do eleitorado no primeiro turno, a extrema direita não derrotou a esquerda e o centro-esquerda, representados pelo PSOL, PT, PCdoB PDT e PSB. Os números dos mapas eleitorais indicam que esses partidos tiveram poucas perdas ou até cresceram na Câmara Federal, apesar da eleição ao Senado ter outra característica. Quem perdeu, de fato, foram MDB, PSDB e DEM, partidos mais identificados com o governo Temer .
Um aspecto que chamou a atenção desde antes da eleição foi a desconfiança lançada por Bolsonaro quanto à possibilidade de fraude. Isso se verificou no esquema montado pela campanha para “receber denúncias” dos eleitores. A esmagadora maioria delas não tinha procedência, foi desmascarada pela Justiça Eleitoral, mas foi o caldo para justificar a existência de um segundo turno.
O esquema profissional da campanha do candidato do PSL teve semelhanças com a campanha de Donald Trump, nos EUA. O uso das redes sociais, das Fake News e todo tipo de boato e mentira, para manter o eleitorado mais conservador apavorado e em alerta, insuflando ódio contra outros candidatos e seus eleitores.
Se há algo importante na campanha de Bolsonaro foi que ela serviu para o Brasil se enxergar. Foi como se um grande espelho cobrisse o país, mostrando a todos como somos, como vivemos, o que cultuamos e como pensamos. Provavelmente não haverá uma grande mudança da campanha de Bolsonaro para o segundo turno, talvez uma certa moderação, o que não combina com sua personalidade.
Já a campanha de Haddad terá que se transformar numa ampla frente política. Apesar do pouco tempo, terá que trabalhar com paciência, ouvindo e dialogando com as pessoas. É preciso valorizar o contato com as amizades e familiares, seja pessoalmente seja pelas redes sociais. Não se pode incorrer no erro de afrontar costumes e o falso moralismo dos que se escondem atrás da indústria da fé, muito menos apelar ao “nacionalismo petista”. É uma campanha da democracia e da liberdade contra o autoritarismo e os ataques aos direitos do povo.
Ainda há espaço para atrair eleitores, tanto uma parte dos que votaram em Bolsonaro no primeiro turno, quanto dos que se abstiveram, anularam ou votaram em branco (cerca de 30% do eleitorado). A sociedade brasileira está cansada de uma falsa polarização. Ao contrário do núcleo de extrema direita que comanda a campanha, a esmagadora maioria dos que votaram em Bolsonaro não são fascistas, assim como o PT está longe de ser um partido comunista.
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